segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Torpemente sólido


Rasgo a noite em desespero profundo
Chamando os nomes todos do mundo
Pensando que o telefone pode tocar
Nem uma letra de uma canção
Nem um filme na televisão
Podem abrandar a dor que se sente
A noite rasga e tem em mim companhia solitária
Penso que uma coisa rara poderia acontecer
Ou qualquer coisa inútil pra me fazer sorrir
Ou qualquer coisa melhor pra poder vislumbrar um novo dia
Morro de amores e alegria, ódio, tristeza, melancolia
Um sal profundo de poesia me corta
Corta as veias antigamente sérias
E agora o que tenho é só um aperto imenso na garganta
No peito uma lembrança que não quer sair de mim
Indecisões do tamanho do mundo
Um sorriso trancado, guardado e profundo
Parece que a dor quer calar lentamente e se cala dando espaço ao nada
Composto daquilo que espero não encontrar
Meu corpo cala, meu rosto se esbarra na terrível amargura urbana
Canso, enquanto saem de mim pensamentos tortuosos
A minha volta algo de milhares de livros e músicas que não querem me olhar
Que eu não quero prender
Mas assim estão
Acalantados pelo sabor inesperado do som que não vem
Pela loucura exata daquilo que desconhecemos e tememos
Mas sigo torpemente sólido
Diante de mim as teclas me falam que devo parar de me olhar
Esquecer de sangrar ou sangrar até esquecer
Me entorpecer daquilo que deveria enternecer
Suavizar o que deveria amortecer
Quem sabe em uma outra hora tudo se transforma
Forma líquida do olhar parado num firme momento estático
Estaticamente estéril, de uma esterilidade tão fértil que abandona
O choro não vem e não chora
Agora o que tenho é sereno nos olhos
Orvalho no meio do meu deserto
Certamente isso não é nada
Certamente terei tudo o quanto for necessário até sorrir
Enquanto isso não vem conto estrelas
E elas me contam o que não sei decifrar
E num súbito um anjo torto vem ter comigo
E me fala do perigo que é estar vivo
E me ouve e sabe dizer o que devo ouvir
Mas não quero uma chuva de pecados
Nem um temporal de virtudes
Quero o rádio ligado entre duas estações onde o trem não para
Para onde o céu não enegrece
Comovo simplesmente
Pela fome da semente que quer nascer
E pela exata hora que não quero desistir de escrever
Quero bater e gritar, na parede e na sala
Mas tudo se cala e vem um silêncio ensurdecedor
Que soa como sino e me faz suar de febre intensa
Dobro os dias e as folhas de papel
E agora durmo, sereno
Sonho, um sonho viril e pequeno
Amargo e impaciente
Demente, vou seguindo pelas linhas que não sorriem
Durmo, insone sonho
Apenas durmo
Só assim me calo
Calo.

Um comentário:

kelen disse...

quase morri de amores
linhas verdadeiramente ternas
ou nao
linnnnndo